quarta-feira, dezembro 31

Vamos bater lata


Numa eleição vence o candidato que consegue melhor convencer aos eleitores de que é o melhor, o mais preparado e o mais confiável para atender aos anseios de seus votantes. Parece óbvio mas essas regras, em muito casos, sãos esquecidas e não raras vezes candidatos são ridicularizados pelos resultados das urnas. Comum também é ver postulantes meterem os pés pelas mãos e cometerem sucessão de erros capaz de deixar o barco fazendo água, prestes a ir a pique.

Hoje li a coluna de política do jornal O Povo. É feita uma avaliação do cenário na Câmara Municipal, que amanhã troca de presidente pelo voto. Salmito Filho, do PT teve seu caminho asfaltado, ao longo dos últimos três meses, pela mais completa ausência de um opositor efetivo que pudesse se contrapor aos desejos do petista. De última hora, surge o adversário Elpídio Nogueira, do PSB, irmão do deputado estadual José Sarto (PSB), que é das rodas de cafezinho do governador Cid Gomes.

Pelos laços sangüineos é um candidato de peso. Sarto já foi presidente da Câmara Municipal e tem participado diretamente de todas as articulações para eleições de Mesa Diretora do legislativo da capital. Salvo melhor juízo, sempre com sucesso, desde 1988. Em todas esses momentos contou com o apoio do amigo, quase inseparável, deputado Carlomano Marques (PMDB), que entrou na vida pública ao mesmo tempo de Sarto, como vereador, e chegou a Assembléia na mesma eleição de seu parceiro de andanças políticas.

Para a refrega de agora, os dois superaram antigas questiúnculas por conta de uns votos no município de Amontada. O prefeito de lá, que apoiava Carlomano, passou a render loas a Sarto. O peemedebista acha ou achava que Sarto o cooptou, coisa que o “socialista” jura de pés juntos que não aconteceu. Mas isso já ficou para o passado e ambos têm trabalhado em busca do poder para Elpídio. Esta dupla unida em prol de um objetivo não é pouca coisa e jamais deve ser desconsiderada ou desprezada.

Mas dessa vez, com o bonde andando, não creio que haverá qualquer alteração na paisagem que se mostra amplamente favorável a Salmito. O petista conseguiu tratorar as pretensões do líder da prefeita, Guilherme Sampaio . Este, achando que desdenhar do poder lhe traria a unção de seus pares (numa versão reduzida e caricata da Janio Quadros), ficou a ver do cais navios passando ao largo. Uma inversão de resultado só poderia acontecer com muita competência política de muitas partes. E isso é produto que está em falta. Quem sabe eu queime a língua, e não estarei aqui para saber. Parto, ainda hoje, para terras sem rádio e sem notícias das terras civilizadas. Até a próxima semana.

Aos poucos que me acompanham e aos muitos que aqui não passam meus votos de um ano de luz.

Playlist para os próximos dias
Buena Vista Social Club
Thelonius Monk
Creedence
Santana
Marcelo D2
Moinho
Chicas
Almann Brothers
Led Zepellin
The Band
Jorge Ben
Costa a Costa
Eliana Printes
Sérgio Dias
Berimbrown

Entre outros

segunda-feira, dezembro 29

Hierofante II


"Quando porém conseguem, são venerados e,depois de suprimir os que tinham inveja de suas qualidades, se tornam poderosos, seguros, honrados e felizes".
Maquiavel.
O russo Isaac Asimov é considerado por quem está podendo ver como o mais talentoso escritor de ficção científica. Escreveu em 1951, se não me falha a memória, a trilogia Fundação, posta em um só volume, mostrando a evolução da humanidade alguns milhões de anos, a frente. Após a conquista do espaço, a terra é esquecida e a própria origem da raça volta a ser desconhecida. Na evolução da conquista de mundos, em primeiro lugar é empregado o uso das armas. Logo esta metodologia passa a ser antiquada, e a religião é o mais poderoso elemento de dominação. A terceira fase de Fundação tem no mercantilismo, proporcionado pelo desenvolvimento tecnológico o principal fator de domínio.

É bem óbvio que Asimov, na realidade, não estava olhando tão distante no tempo. Pelo contrário. Estava se espelhando na experiência humana, onde força, religião e poderio econômico até hoje estão bem presentes na composição do poder real.
A linguagem da ficção se espelha na história real, onde nenhum poder se eterniza com o uso apenas da força. É preciso mais que isso para dominar corações e mentes. Por isso, os principais conquistadores se apoderaram do simbolismo religioso para escravizar sociedades. E isso ainda se usa até hoje.

Todo um código de conduta e moral se impõe pela origem divina. Mais uma vez entra em cena os hierofantes, porta-vozes de Deus, no processo de conquista.

A partir de determinadas crenças, são legitimadas as ações que descontextualizadas não passam de alta crueldade. Se na idade média pessoas iam para a fogueira mediante acusação de bruxaria, hoje não está muito diferente.

Em nome de crenças religiosas, palestinos são mortos às centenas simplesmente porque, em análise mais simplória, não professam o judaísmo.
A discriminação de ordem religiosa, a aqueles que teimam em seguir o hierofante é talvez, salvo melhor juízo, a mais cruel porque o discriminado não é só inferior ao discriminante. É também apontado com possuidor de demônios e fadado a danação eterna. Sua vida não tem nenhum valor e sua morte representa um bem à humanidade.

O poder aferido ao hierofante assume dimensões drásticas. Quando a comunidade confere poderes divinos, seduzida pelo poder das idéias do líder, há sempre conseqüências. Levas de pessoas deixam de raciocinar por si próprio e caminha a passos céleres em rumo ao fanatismo. Há exatos 30 anos, em 11 de novembro de 1978, para ser mais preciso, 914 seguidores do pastor Jim Jones, da seita Templo do Povo, lançou-se ao suicídio na Guiana. O pastor era norte-americano e tinha fundado diversas igrejas em seu país, antes de se tornar um genocida e se suicidar.
Esse é só um caso que alcançou repercussões internacionais por suas conseqüências.

Esses mesmos hierofantes continuam agindo impunemente e ainda revestindo-se de uma aura de superioridade. A humanidade ainda não conseguiu caminhar com os seus próprios pés e entrega-se a líderes, como se cega fosse, em vias de tropeçar ao primeiro passo.

domingo, dezembro 28

Rito de passagem


Trocar estado civil. Sonho de praticamente todas as mulheres e grande temor de boa parte dos homens. A idéia que eu tenho é que famílias se formam a partir da vontade feminina. Cabe às mulheres decidir constituir um núcleo capaz de se auto replicar ad infinitum.

Poderosas que são, sempre chegam a esse objetivo.
Mas nem tudo é só antropologia ou sociologia. Há um sentimento poderoso quando se resolve sair da solterice e assumir as responsabilidades conjugais. Sentimento esse capaz de produzir uma energia forte e levar muita gente às lágrimas.

Quem repetiu esta missão humana de contrair núpcias hoje foi a minha amiga Patrícia. Casou-se com o Giuliano, e agora assina Marques Vilanova. Muda também de cidade indo se estabelecer na meca do capitalismo nacional. Longa e feliz vida aos noivos. Planos para visitá-los quando passar a honey moom.

Todos os amigos irão sentir muito a sua falta. Pessoa valorosa, de sorriso sempre presente e pronta a auxiliar a quem dela precisa.


PS. Clicando na foto pode-se vê-la em tamanho original.

sábado, dezembro 27

Hierofante



Sempre me enrolo em citações literais. Meu cérebro não se preocupa com isso. Admiro pessoas que decoram poesias enormes e declamam a qualquer momento sem gaguejar. Não é o meu caso. Há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia. É mais ou menos assim que Pook, em Sonhos de uma noite de verão, fala. Se não foi ele, deve ter sido algum outro personagem de Shakespeare. Até falam que este autor inglês na realidade nunca existiu, mas aí já é outra história.


Somos feito da mesma matéria de que são feitos os nossos sonhos. Não sei que compreensão alguém possa ter deste termo. Eu só tenho a minha. Estamos constantemente interagindo com forças invisíveis. Cada ação geral uma reação em sentido contrário. Uma lei da física mas que envolve também o nosso mundo, digamos, espiritual.

Quando se estuda comunicação a gente percebe que as pessoas são mobilizadas a partir do nível de mensagem ao qual está submetida. Quem comunica melhor vai dominar. Este é o princípio adotado tanto líderes políticos quanto espirituais. Comunicar é poder. O processo permite que se opere em vários estágios. Em vários níveis. A dominação real advém do simbolismo que as coisas adquirem. O que é nação? O que é o inferno? O que é a salvação? O que é a paz?

A conquista da liderança é sempre um jogo de comunicação. Há determinadas técnicas que impingem ao meio social sentimentos que levam a entregar ao domínio do líder o seu próprio destino. Quanto mais eficiente o poder de comunicação, mais facilmente os seguidores serão manobrados. É um processo ao mesmo tempo simples, a quem domina determinada técnicas. E invisível a quem está submetido a este poder.

Dois fatores são essenciais para a manipulação de mentes: prestígio e credibilidade. Quem colocar entre suas propriedades imateriais esses elementos assume a liderança, se quiser. Para isso acontecer, na outra ponta deve existir reconhecimento e fé. Se isso não está presente, só através da força ou das leis, que também são força, se chega à liderança.

O prestígio e a credibilidade fazem da palavra uma lei consuetudinária.Em muitos casos, as palavras podem ser habilmente articuladas, dispensando construções literais. As entrelinhas também são poderosas. Assim com a gestualidade. Princípios tidos e havidos com esotéricos acontecem no cotidiano. Independente do que cada um possa ter como mundo real.

sexta-feira, dezembro 26

Estatísticas se repetem mais uma vez

Como havia antecipado no post anterior. Mais uma vez a violência bateu recordes na noite de natal. O Instituto José Frota, principal hospital de atendimento de emergência registrou uma elevação no número de casos, em relação ao ano passado, de 12,4%. O trânsito liderou as estatísticas com 145 casos. Acharia pitorescas, se não fossem trágicas, 51 quedas da própria altura. Provavelmente a grande maioria de bebuns que não se agüentaram em pé, após tantas bebemorações.

Segue matéria de O Povo.

Oitocentos e trinta e dois atendimentos foram realizados no Instituto Dr. José Frota (IJF) no feriado de Natal neste ano, entre terça-feira, 23, e sexta-feira, 26. O número representa um aumento de 12,4% se comparado com o mesmo período em 2008, quando foram realizados 740 atendimentos.

De acordo com o balanço do IJF, o maior número de atendimento foi gerado pela violência no trânsito, 145 casos, sendo 69 acidentados de motos, 29 atropelamentos, 35 abalroamentos, duas vítimas de capotamento e 10 por queda de bicicleta.

O IJF recebeu, ainda, 34 atendimentos por agressões físicas, 26 feridos por arma branca e 19 por arma de fogo, 51 vítimas de queda da própria altura, 33 de queimaduras e 10 vítimas de picadas de animais peçonhentos, quatro pacientes envolvidos em acidentes na prática de esportes ou ambiente esportivo, além de 17 vítimas de acidentes de trabalho.

quinta-feira, dezembro 25

Jingle bells


Acordar numa madrugada de 25 de dezembro, quando todos estão dormindo, não deixa de ser estranho. Bem, pelo menos acho que todos estão bem e no conforto do recesso de seus lares. Estranho também é saber que estatisticamente, a noite de 24 de dezembro é uma das mais violentas do ano, rotineiramente, há várias décadas. Lembro-me de ter visto essas estatísticas da cidade há muitos anos, e desprentenciosamente acompanho a evolução desses números a cada dezembro. Os dados se repetem numa constante constrangedora.

O que deveria ser uma data de paz se transforma, para muita gente, em momentos de aflição. A maior responsável é a violência do trânsito. Neguinho começa a encher a cara cedo, e passa a noite mudando de endereço, visitando parentes, amigos, paqueras e similares. Ninguém liga para o volume de álcool ingerido até encontrar-se com um poste atravessando uma rua de faróis apagados. Vida louca vida.

Mas é sempre bom rever os parentes e amigos. Pelo menos eu acho. A medida que o tempo passa, muitas coisas perdem o significado, muitos amigos se afastam pelos mais variados motivos. Mas há também os laços que se fortaleceram e as glórias que vivemos no passado que valem a pena serem contadas mais uma vez.

Sei de muita gente que sente depressão neste período do ano. Ruim olhar para o lado e ver tanta gente se cercar de parentes e amigos, e se sentir em uma ilha deserta. Ou fingir que está alegre quando se nada em uma maré de dificuldades avassaladoras. Mas há sempre uma saída. Eu sei.

PS. Foto de artesanato em pedra e metal de Diamantina, by me

segunda-feira, dezembro 22

Avaliação de desdobramentos da Operação Satiagraha

Mais um trabalho apresentado na Especialização que continuo cursando:

O presente trabalho tem por objetivo avaliar as matérias intituladas “Torneira aberta” páginas 32 a 34 da Revista Carta Capital, e “A prova dos abusos” páginas 60 a 63, da revista Veja, ambas edições de 19/11/08, que trazem desdobramentos da operação da Polícia Federal batizada de Satiagraha, comandada pelo delegado da PF Protógenes Queiroz, que teve como principal alvo o banqueiro Daniel Dantas. As duas publicações mostram, através dos textos e fotos editadas, seus posicionamentos em relação ao assunto, tentando impor a opinião pública suas crenças próprias. A operação Satiagraha teve o seu ponto decisivo em 8 de julho de 2008 quando, comandada por Protógenes Queiroz, efetuou a prisão do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e o banqueiro Daniel Dantas, do banco Oportunnity, acusados, entre outros crimes de corrupção ativa e passiva, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta e formação de quadrilha.

Protógenes Queiróz, ao mesmo tempo, também se transformou em alvo de investigações por parte do Ministério Público e a própria Polícia Federal, acusado de desvio de conduta, interceptação de comunicação telefônica, violação de sigilo funcional, desobediência, usurpação de função pública e falso testemunho (Revista Isto É Ed 26/11/08). Ao mesmo tempo, é alvo de reportagem o presidente do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, que por duas vezes concedeu habeas Corpus favorecendo o banqueiro Daniel Dantas, depois de ele ter sido preso em cumprimento a mandado judicial. O caso, ao que se pode perceber fazendo a leitura das duas reportagens, cabe diversas interpretações, e cada publicação defende os seus pontos de vista, elegendo os vilões e os heróis desta intricada situação. Através da hipótese da Agenda Setting, nos propomos a avaliar as matérias citadas.

A AGENDA SETTING

Esta hipótese surgiu nos anos 70, a partir de pesquisas realizadas sobre efeitos dos meios de comunicação de massa sobre o público. A hipótese demonstra que as informações produzidas ou reproduzidas pela mídia tem uma influência direta no público receptor e funciona como agente modificador da realidade social, agendando os assuntos que passaram a ser tratados e discutidos pelo conjunto da sociedade.

Em 1972 foi publicado o trabalho realizado pelos pesquisadores Maxwell e McCombs, sob o título “Agenda Setting Function of Mass Media”, que propõe hipóteses de como se avaliar a influência da mídia sobre os eleitores, em 1968, nos Estados Unidos, quando a presidência do país estava em disputa.

As hipóteses articulam-se em torno das seguintes idéias: “em conseqüência da ação dos jornais, da televisão e de outros meios de informação, o público sabe ou ignora, presta atenção ou não, realça ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentos aquilo que os mass média incluem ou excluem do seu próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, às pessoa” (McCombs e Shaw, 1972 apud: Mauro Wolf, 2001:144).

Porém, vale salientar que apesar de determinados assuntos estarem sendo agendados, não necessariamente as interpretações dos fatos através dos veículos de comunicação serão os mesmos. Nas duas edições (Veja e Carta Capital) que abordamos, é evidente que há pontos de vista diferentes e, em muitos casos até conflitantes. Enquanto a revista Veja se pauta em descaracterizar a lisura o trabalho da Polícia Federal, a Carta Capital aponta em outra direção, tendo como alvo o ministro do STF Gilmar Mendes, entre outros. Vale salientar que foi este presidente do Supremo Tribunal Federal que por duas vezes concedeu os habeas corpus ao banqueiro capturado pelo delegado Protógenes Queiroz, cumprindo mandado de prisão de juiz singular.

McCombs diz que as coberturas midiáticas têm uma forte influência sobre a forma do público perceber a realidade em sua volta. O processo de agendamento da mídia procura, através da construção da notícia, destacar assuntos que pontuarão de forma efetiva e relevante a agenda pública. Esses assuntos são escolhidos segundo critérios estipulados pela própria mídia e transferidos aos públicos em forma de notícia, para que também participe da agenda da comunidade. A hierarquização da importância estaria muito mais em conseqüência do espaço ou tempo concedido a cada notícia do que as causas e conseqüências que cada fato pode ter na vida da comunidade. Como exemplo, podemos citar que hoje no Brasil se fala muito mais sobre as últimas eleições acontecidas nos Estados Unidos do que o pleito para prefeito e vereadores acontecido em outubro passado. Apesar de a vida nas cidades dependerem muito mais das decisões dos chefes dos executivos municipais eleitos, os olhos da mídia local, nacional e internacional se voltam muito mais aos nomes que vêm sendo indicados por Barack Obama para compor a sua equipe de governo. Para a hipótese do Agenda- Setting o que é objeto saliente para a agenda da mídia passa a ser objeto saliente também para a agenda do público.

Convém assinalar que diferentes meios de comunicação podem utilizar modos diversos elementos de agendamento pelas diferentes formas de hierarquizar um assunto na “ordem do dia”, ou muitas vezes pela omissão ou realce que estes podem fazer de um determinado assunto. Estudos feitos por McClure e Patterson (1976) sobre as eleições presidenciais americana de 1972 revelam que a exposição às notícias televisivas teve efeitos menores sobre o público em comparação aos efeitos diretos associados ao consumo de jornais locais (Wolf, 2001:148). O mesmo não se pode afirmar em relação aos fatos no Brasil. É sabido que as mensagens transmitidas pelas emissoras de TV, em nosso país, têm um destaque bem mais acentuado, sobretudo porque a grande maioria de nosso público não consome meios impressos.

Para se ter uma idéia da diferença entre os mídias o Jornal Nacional da Rede Globo possui uma audiência média em torno de 45% de todos os lares brasileiros, enquanto que a Folha de São Paulo, de circulação nacional, não alcança uma tiragem superior a 450 mil exemplares, alcançando a cada número um público médio aproximado de 2 milhões de brasileiros, ou seja, pouco mais de 1% da população nacional.

Outro ponto que queremos destacar é que quando um mídia apresenta um determinado objeto ele também nos fala algo sobre os atributos desse objeto. Estes atributos, enfatizados em vários graus, definem o que vem sendo chamando de segundo nível do agenda-setting. “O primeiro nível do processo do agenda-setting é a transmissão da saliência do objeto e o segundo nível é a transmissão da saliência dos atributos desse objeto” (Mc-Combs, Lopez-Escobar, e Llamas, 2001) . Um enquadramento afetivo expande a teoria ao considerar que a imagem e sua força expressiva (expressões faciais, posturas, gestos, linhas, enquadramentos) podem influenciar a avaliação afetiva dos observadores e gerar um impacto potencial sobre a forma de o eleitor perceber um personagem abordado pelas reportagens.

Assim, o objetivo deste nosso artigo foi o de também avaliar o papel dos elementos visuais na hipótese do agenda-setting e seu segundo nível de análise. Observamos que as fotografias podem, assim como o texto escrito, funcionar como elemento de agendamento, inclusive deixando claro o posicionamento dos diferentes veículos em relação aos personagens.

A REVISTA VEJA - Na reportagem da revista Veja, o delegado Protógenes é apresentado boquiaberto, como que surpreso por ter sido apanhado cometendo alguns deslize. Outro personagem mostrado em foto destacada, ocupando o alto da página é o juiz Fausto de Sanctis, que por duas vezes pediu a prisão preventiva de Daniel Dantas. Por conta disso, o banqueiro nas duas oportunidades obteve habeas corpus exarado pelo próprio presidente do Supremo Tribunal Federal. As fotografias sugere também que os dois estão abatidos em face dos resultados da operação, que não levou a termo a prisão de Dantas. Na primeira página da reportagem, é exibida a foto do delegado Paulo Lacerda, que comandava a Agência Brasileira de Informação e que foi afastado do cargo após denúncias de ele ter favorecido a realização de grampos irregulares a pedido do delegado Protógenes. A foto de Lacerda exibe um rosto contraído inspirando um posição de mal-estar. As três fotos, em nossa avaliação, contribuem para a elucidação do texto, que é francamente opinativo, apontando para erros e excessos cometidos pela polícia federal ao longo do processo investigativo.

O “abre” da reportagem da Revista Veja diz: “ A Veja teve acesso ao áudio da famosa reunião entre o delegado Protógenes e a cúpula da Polícia Federal em que ele nega a participação de espiões da Abin na Operação Satiagraha – e admite que tinha informação “de inteligência sobre o que se passava no STF.”

Este texto aponta uma clara contradição no que seria o depoimento de Queiroz. Como ele poderia ter informações de “inteligência sobre o STF e ao mesmo tempo não contar com o apoio da ABIN. A reportagem não diz o qual seria a categoria dessa “inteligência”, mas o leitor mediano será compelido a pensar que se trata realmente de uma espionagem irregular.

O texto lembra também que quando aconteceu a reunião da cúpula e Queiroz nada foi efetivamente divulgado sobre o teor da conversa. Somente que Fo tensa e resultou na transferência de Queiroz para outro posto da Polícia Federal. Não ficou claro se a pedido do mesmo ou se compulsoriamente. A matéria revela que a reunião “foi pontuada por brigas e trocas de acusações pesadas entre a cúpula e a equipe de Protógenes... ele chegou a ser chamado de paranóico por seus superiores”.

A matéria, francamente desfavorável a Protógenes, enquanto dá declarações textuais dos opositores do delegado, diz que ele “..tentava explicar aos seus superiores por que não comunicara a eles o fato de terem sido recrutados para a operação agentes da ABIN... também já existiam suspeitas de que o gabinete do presidente do Supremo Gilmar Mendes estaria sob vigilância clandestina”. Mas o que é vigilância clandestina? A reportagem não é enfática, deixa apenas que o leitor imagine que estava acontecendo ”arapongagem”, termo utilizado para indicar uma escuta telefônica irregular. Também é sugerido que o STF deveria ser intocável, independente do que possam fazer os seus ministros. A Polícia Federal não teria direito de investigar qualquer irregularidade praticada por Gilmar Mendes ou qualquer um dos membros da corte.

“Em certo ponto, as conversas praticamente confirmam uma das mais ousadas ações clandestinas do grupo Protógenes: a espionagem do gabinete do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes”, está escrito na página 61.

Ao que se imagina, alguma coisa que praticamente aconteceu, não aconteceu de fato. Quando se diz que um carro praticamente virou na curva, no entendimento de um leitor mediano é que o carro efetivamente não virou, chegou só próximo disso. No caso da reportagem da Veja, entendemos que o realce da frase “praticamente confirmam” dá outra conotação. Quer dizer que o fato está confirmado nas entrelinhas, que o ministro foi espionado.

O texto segue, na mesma página citada, afirmando que naquela altura dos fatos, sabia-se apenas
que os arapongas tinham cooperado com o delegado da Polícia. Ou seja, os agentes da ABIN foram reduzidos pela reportagem a arapongas, como são chamadas todas as pessoas que promovem escutas ao arrepio da lei.

As demonstrações de que a agenda da publicação da Editora Abril quer mesmo atacar a imagem do delegado e quem possa se opor ao ministro Gilmar Mendes e o Banqueiro Daniel Dantas não cessam por aí. A Veja sugere que o trabalho de Inteligência realizado pela Polícia Federal para antecipar os habeas corpus de Mendes que iriam libertar Dantas também foi ilegal. A reportagem dá também como fato verídico que houve também escutas ambientais, sem levar em conta a possibilidade de algum funcionário tenha denunciado o próprio ministro por suas ligações com Dantas.

De tão considerar verdadeiras as suas suposições, sem dar chances a qualquer interpretação divergente dos fatos, a reportagem afirma ainda que Protógenes mentiu a seus superiores ao afirmar que a participação da Abin no caso foi tão somente checando informalmente endereços dos investigados.

E, como indício de que Protógenes estaria investigando o Supremo Tribunal Federal a reportagem isola a declaração de Queiroz, onde ele afirma que a operação “estava investigando corrupção nos três poderes”. A revista Veja não demonstra nenhuma preocupação, em toda a reportagem em averiguar se a hipótese levantada pelo delegado da PF sobre a existência de corrupção seria verdadeira ou não. Veja apenas levanta suspeitas, e procura passar a idéia de que essas suspeitas são a realidade, de que Queiroz produziu toda espécie de crimes ao procurar desvendar uma possível triangulação corrupta entra os poderes constituídos e o banqueiro.

O juiz Fausto de Sanctis, também apontado com “assecla” de Protógenes (as aspas são minhas), não escapa do rol de acusações de Veja. A Reportagem cita depoimento da desembargadora Suzana Camargo alegando “que o juiz dizia estar informado sobre o que se passava dentro do gabinete do ministro Gilmar Mendes”. Em nenhum momento há na reportagem qualquer questionamento sobre que assuntos tão explosivos seriam estes tratados no gabinete do presidente do Supremo que não podem vir a público. A direção da reportagem é no sentido de que o juiz também “recebia informações do tal trabalho de inteligência que teria sido citado por Protógenes, segundo a Veja.

O juiz De Sanctis, que tentou prender um banqueiro criminoso, já que hoje Dantas é condenado, é sugerido por Veja como nazista. Segundo Veja, em sua página 62/63 diz textualmente que “o juiz surpreendeu de novo ao defender a tese de que a Constituição e por conseqüência as leis menores não pode sobrepujar à vontade do povo. Parece bonito e libertário, mas longe de as idéias de De Sanctis serem originais têm raízes nas teses formuladas pelo alemão Carl Schmitt (1888 – 1985) um dos inspiradores do arcabouço jurídico do nazismo”. Acentua ainda que a idéia do juiz federal se comparam a de Adolf Hitler.

O final da reportagem é reservado para anunciar que toda a Operação Satiagraha está sob investigação a cargo “do corregedor Amaro Ferreira”. E avisa que “em três meses de trabalho, ele identificou 84 agentes da Abin que por ordem do delegado Paulo Lacerda, afastado da direção da agência, trabalharam clandestinamente sob o comando de Queiroz, realizando tarefas mais abrangentes do que chegar endereços... que em alguns momentos trilhou caminhos criminosos... ”, (pag. 63).

O outro lado da mesma moeda – CARTA CAPITAL.

Se a reportagem de Veja procura condenar tudo o que possa ter sido produzido pela operação Satiagraha e seus protagonistas, a revista Carta Capital procura mostrar que os antagonistas do delegado Protógenes e do juiz De Sanctis não podem ser vistos como meras vítimas de ocasião da sanha investigativa do agente da PF e do magistrado federal. São duas matérias coordenadas que compõem o texto editorial tratando do caso: “Nos rincões dos Mendes”, procurando estabelecer ligações perigosas entre o presidente do Supremo e setores econômicos e “Torneira aberta”, procurando mostrar que houve vazamento de informações favorecendo investigados pela operação Satiagraha.

A Capa de Carta Capital exibe uma foto que ocupada toda a página , exibindo o presidente do STF de chapéu de coronel-fazendeiro. O título é “nos domínios de Gilmar”, com um breve texto abaixo: “ Em Diamantino (MT), a família Mendes exerce o poder à moda antiga. E tira proveito. Mas a oposição venceu as eleições e promete uma auditoria na Prefeitura, comandada pelo irmão do ministro.

Na foto, Gilmar está com a boca entreaberta, semelhante às fotos de De sanctis e Queiroz, na revista Veja, em estudo. A idéia que a imagem passa é a de quem foi pego em situação no mínimo desconfortável. A informação de que será pedida uma auditoria na Prefeitura, nos remete a idéia de que aconteceram irregularidades de responsabilidade do irmão do ministro do STF, numa tentativa de ligá-lo a práticas ilícitas do parente próximo. A matéria, logo a primeira vista, se mostra amplamente desfavorável a Gilmar Mendes.

Logo no primeiro parágrafo da matéria “Nos rincões dos Mendes” é dito que existe em “Diamantino, a 208 quilômetros de Cuiabá, em Mato Grosso, um estado policial”. Trata-se de “uma oligarquia nascida à sombra da ditadura militar (1964-1985), mas derrotada nas eleições passadas, depois de mais de duas décadas de dominação”. Afirma ainda que o irmão caçula de Mendes manteve-se por oito anos no cargo de prefeito graças à influência do presidente do ministro (pag. 24), que também foi o primeiro advogado-geral da União, nomeado por Fernando Henrique Cardoso.

A Carta Capital descreve um caso claro de tráfico de influência de Gilmar, ao citar (pag. 24) que ele atuou para eleger o irmão levando “ministros para inaugurar obras e lançar programas, além de circular pelos bairros da cidade, cercado de seguranças, a pedir votos para o irmão candidato”. De forma clara, um dos principais antagonistas de Protógenes Queiroz, Mendes tem a sua imagem pública claramente atacada.

A reportagem (pag. 24) revela também que teria sido Mendes o líder de um lobby político que escolheu o local para a instalação de um complexo formado por um abatedouro. Uma usina de biodiesel e um curtume. O investimento, segundo a revista, é da ordem de R$ 230 milhões e tem a perspectiva de geração de 3,6 mil empregos. Tudo isso com o objetivo, segundo a revista, de favorecer o esquema político de Mendes. O grupo Bertin, dono do investimento, no entanto, foi condenado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em novembro de 2007, dois meses após a assinatura do protocolo, por formação de cartel com outros quatro frigoríficos, segundo Carta Capital.

A revista segue desconstruindo a imagem do presidente do STF e em um quadro de duas páginas (pags. 26 e 27) apresenta entrevista com o prefeito eleito de Diamantino, Erival Capistrano. No “abre” da matéria a Carta Capital diz que a ameaça de auditoria na prefeitura levou a família Mendes ao desespero. “Quero descobrir para onde foi o dinheiro de Diamantino dos últimos 20 anos”, é essa declaração que estaria causando o temor da família Mendes, como se houvesse realmente desvios de recursos públicos.

Carta Capital revela ainda que o ministro Gilmar Mendes teria afirmado que é acionista de do Instituto Brasiliense de Direito, que “obteve contratos sem licitação com órgãos públicos e empréstimos camaradas de agências de fomento”. A matéria segue afirmando que há em diversos momentos da administração pública da cidade indicações claras de tráfico de influência, troca de votos por cestas básicas e ameaças aos adversários públicos. Ao todo, teriam sido detectadas pelo Tribunal de Contas do Estado 38 irregularidades na gestão do irmão do ministro (pag. 28). Tais fatos, por si só, seriam suficientes para impor o título de coronel à antiga a Gilmar Mendes.

A reportagem “Torneira Aberta” (pags. 30 e 31) dá outro tom ao vazamento de informação. Enquanto Veja se deteve às questões de arapongagem, principalmente, Carta Capital avalia que o advogado do Banqueiro Daniel Dantas, Nélio Machado, estaria recebendo informações da juíza Adriana Pileggi Soveral sobre a operação Satiagraha. O caso estaria sendo investigado pela Corregedoria da Justiça Federal em São Paulo. Tais fatos estariam captados pelas escutas telefônicas da Polícia Federal. A juíza, segundo a revista já teria sido processada por uso de placas frias.

“É possível que o vazamento atribuído à juíza passe despercebido, no momento em que apenas as supostas falhas e excessos do delegado Protógenes são alvo de apuração e indignação”, diz a matéria de Carta Capital. A notícia insinua ainda que o vazamento das informações tem como foco a ação policial do dia 8 de julho, quando filmagens da rede Globo aconteceram no momento da prisão do ex-prefeito Celso Pitta, também apontado como parceiro de Dantas em seu “rosário de crimes”. A foto do caso, inclusive, é exibida na reportagem da Revista Veja.
Para Carta Capital, há um claro plano de desmonte da operação Satiagraha e de indiciamento de Queiroz. “Até o ministro da Justiça caiu na armadilha ao criticar a pirotecnia nas operações da Polícia Militar”, diz a revista em sua página 31. A foto da juíza, nesta página, tem a mesma expressão de quase susto, em lábios entreabertos, enquanto Protógenes é exibido fazendo sinal de silêncio, indicando de forma imagética, que estão falando demais ou em um volume desnecessário.

Quanto às acusações de que a ABIN agiu de forma irregular ao auxiliar as investigações da Polícia Federal, a Revista Carta Capital diz (pag. 31) que outras instituições federais sempre socorreram a PF em suas operações. “Para o procurador da República Rodrigo De Grandis, é normal a participação dessas instituições”.

CONCLUSÃO

Pela hipótese da Agenda Setting, há um claro antagonismo entre os dois meios de comunicação na abordagem dos desdobramentos da Operação Satiagraha. Quem ler a revista Veja pode muito facilmente se envolvido com a linguagem de que as ações da Polícia Federal e do juiz Federal De Sanctis foram pontuadas de irregularidades, e em alguns casos assumindo proporções nazistas, próprias dos estados totalitários. A Carta Capital, como se tivesse conhecimento (ou de fato tendo) do que seria publicado pela Veja, dá uma série de interpretações defendendo as ações da Polícia Federal , o delegado Protógenes e o juiz De Sanctis, ao mesmo tempo que aponta um lado obscuro no ministro Gilmar Mendes e em outros personagens que estão se confrontando com os protagonistas da operação. O caso segue em curso, e o banqueiro Daniel Dantas já foi condenado a 10 anos de cadeia, por alguns dos crimes que praticou. Continua em liberdade por ter recorrido da sentença da primeira instância.

sábado, dezembro 20

Breve homenagem a uma magra de ruim


Ser normal deve ser um saco. Vestir-se normal, trabalhar normal, expediente normal, ter idéias normais. Essas geralmente herdadas de gerações, aprendida com os pais. Nascer, crescer, se matar de estudar (às vezes), passar no vestibular, definir uma profissão (dessas que já estão definidas pelo conjunto da sociedade, quer seja vinda de um curso técnico ou superior), casar, ter filho, e repetir o ciclo todo novamente. Nada muda, além dos problemas crescentes advindos da modernidade. Mais estresse, menos ar respirável, dificuldade de um emprego minimamente decente, violência, mais filas para todo lado que se vá. Em compensação, a velocidade do PC e da net vai também aumentando à medida que o preço cai. Bela compensação.

Cada vez mais difícil de não ser normal. Alguns tentam fazer coisas ousadas, diferentes, seguir os próprios instintos. Mas não há mais nada diferente. Já está tudo devidamente catalogado, rotulado, embrulhado e disposto em arquivos para consultas posteriores. Ser normal não rende nem uma história. Apesar de toda essa mesmice que marca o início do milênio, há algumas raras pessoas que ainda buscam o seu sonho pessoal. Não aquela idéia de conseguir sair da vala comum e conquistar o topo da pirâmide social, julgando-se ser de uma fibra superior. Mas o desejo firme de escrever uma história que não tem paralelo no seu meio.

São essas pessoas que têm a minha admiração.

terça-feira, dezembro 16

Ao arrepio da lei



Um empresário resolve construir um prédio totalmente irregular. Dentro de uma área de proteção ambiental, com cota além do que a legislação urbanística permite. Será que ele vai pedir o licenciamento à Prefeitura? É possível que sim, mas pouco provável. O funcionário que conceder tal licença poderia ser demitido por improbidade administrativa, prevaricação e até corrupção. O caminho, então é recorrer ao Judiciário. Um simples juiz vai lhe dar uma liminar que não só autorizará a construção como também impedirá que o poder público municipal exerça o papel de fiscalização.

Simples assim. Em Fortaleza há algumas dezenas de construções em execução autorizadas por juízes de primeira instância que se arvoram do direito de “licenciar” os mais estapafúrdios projetos de engenharia, degradando o meio ambiente e transformando a cidade em um caos. O resultado é uma cidade, além de desorganizada, com sérios problemas de saneamento, transporte ineficiente, trânsito travado a maior parte do dia, espaços públicos privatizados.

E alguém imagina que essas generosas concessões judiciárias estão acontecendo a troco de nada? Claro que não. O mundo todo, que acompanha os casos, fala a boca miúda a dinheirama que os empresários direcionam aos juízes em troca de liminares que não são escandalosas porque todos calam diante do temor de se transformarem em alvo de algum processo. E quando alguma denúncia neste sentido tem conseqüência, o processo corre em “segredo de justiça”, evitando que a sociedade, que paga os gordos salários de juízes corruptos, saiba o que acontece nesse submundo abjeto. O importante é manter a vestal incólume de todo um poder podre por dentro, mas que se mantém acima do bem e do mal com uma grossa capa do verniz da soberba.
Aí a gente abre os jornais de hoje e vê estampada em letras garrafais a notícia da entrega da medalha Clóvis Beviláqua pelo Tribunal de Justiça a algumas personalidades. A medalha, aos meus olhos, é uma afronta ao grande jurista que foi Beviláqua e uma tentativa de atrair a simpatia de alguns ilibados e conceituados, como o jurista Paulo Bonavides. Estes, ao mesmo tempo conferem um prestígio ao Judiciário, que pela suas próprias ações não mereceria. Pelo contrário. Se todos soubessem o que se passa no Tribunal de Justiça, talvez o prédio já tivesse sido dinamitado com toda a sua corte dentro.

segunda-feira, dezembro 8

Minority Report


A cada eleição, registra-se o dia mais tranqüilo nos plantões de atendimento em emergências hospitalares. A calmaria é obviamente relacionada à chamada lei seca, que proíbe a comercialização de bebidas alcoólicas no dia do pleito. Os índices de criminalidade, nesta data, também são reduzidos drasticamente em função do controle do grau etílico da população.


Desta forma, nada mais óbvio do que reduzir o horário de funcionamento dos bares da cidade para coibir a violência, atentados contra a vida, assassinatos produzidos por armas brancas, revólveres, pauladas e pedradas. Fruto dessa visão, surge na Câmara Municipal projeto de lei dispondo que a comercialização de álcool para consumo humano só pode acontecer até, no máximo, meia noite de sexta a domingo e 23 horas, nos demais dias da semana.

Como no filme Minority Report , os crimes serão antecipados por mentes iluminadas e todos vão ser privados de sua liberdade. Quase que um toque de recolher em toda cidade, já que não há nada o que se fazer em nenhum lugar. A embriaguez, deduzo eu, fica reservada aos abastados que possuem amplos locais privados que possam reunir amigos a dezenas, assegurando a alegria de todos. Nesses espaços, a lei não terá nenhum alcance, pois legisla apenas sobre comercialização, e não sobre o consumo.

Em nossas terras, parece que é sempre assim. Mata-se o gado para se livrar do carrapato. Condena-se toda uma cidade ao mais violento tédio porque alguns celerados, a cada final de semana, frustram as possibilidades de convivência civilizada produzindo um código penal de crimes. Como o Estado (poderes legislativo, executivo e judiciário) é incapaz de manter a ordem por sua ineficiência, lança o seu poderoso braço e tenta criar uma lei que na prática se transformará em um toque de recolher branco, empurrando a golpes de tédio toda uma população ao recesso de seus lares.

Não sei se leis desta natureza são criadas por questões meramente demagógicas ou por se por ingenuidade de seus autores. Há um código penal que coíbe toda forma de perturbação da ordem pública. Lei do silêncio, criminalização do porte de arma, sanções as mais diversas para agressores, assassinos e outros transgressores da paz social. O aparelho estatal simplesmente faz de conta que o problema não é com ele e dá as costas a esta realidade jurídica. Ninguém é preso, não existem investigações, os julgamentos são viciados, e de cada dez assassinatos acontecidos em Fortaleza só um assassino é indiciado e de cada dez indiciados, só um é condenado e cumpre pena de fato. 99% de tudo de ruim que acontece fica na mais completa impunidade. E é claro que se é tão fácil assim ficar impune, por que cumprir a lei? E se o transgressor possui cifrões em quantidade, basta tão somente contratar um bom advogado esquematizado com poder judiciário.


Prazos de um processo jurídico podem ser prorrogados a exaustão, fazendo os crimes prescreverem. Então, proibamos os bares de vender bebidas e está decretado o fim da violência.
Será isso ingenuidade? Será que nunca ouviram falar na lei seca instituída nos Estados Unidos, quando o consumo de bebida alcoólica foi banido? Para os que nunca ouviram falar disso ou estão esquecidos, quero lembrar que foi um dos períodos mais violentos da história daquele país. Quem nunca ouviu falar a formação de gangues de tráfico de bebida do Canadá, como mostra o filme “Os Intocáveis”? Isso não é ficção, realmente aconteceu.

Outro dado que vale ser salientado é que uma coisa é se passar um domingo, a cada dois anos, sem poder beber em bares. Outra, bem diferente, e nunca mais haver um final de semana onde se possa se estender o lazer regado a algum fermentado ou destilado, além do horário estabelecido em lei. Será que essa nossa gente, tão avesso a respeitar legislações por conta da falta de fiscalização vai se curvar como cordeirinho a essa nova realidade sem reagir? Será que vai mesmo haver um controle efetivo da comercialização de bebidas, ou os amigos do rei vão poder aferir lucros ainda maiores com esse mercado na clandestinidade?

Sinceramente, a julgar pela nossa tradição, que passa décadas assistindo uma contravenção como o jogo do bicho, que convive com cassinos disfarçados de bingos funcionando às custas de liminares judiciais, não creio que o jeitinho brasileiro irá desaparecer de uma hora para outra. Essa nova versão da lei seca, na minha modesta avaliação, irá tão somente propiciar o surgimento de novas modalidade criminosas. Melhor seria se fazer cumprir todas as legislações que regulamentam o convívio social, punindo exemplarmente todos os transgressores, como acontece normalmente, sem nenhuma estapafúrdia, nos países civilizados. Que todos os criminosos cumpram suas penas sem que tenhamos casos como do jornalista Pimenta ou de Daniel Dantas, que certamente não verão nunca o sol nascer quadrado pela condição econômica que desfrutam.

Fortaleza, mundialmente conhecida como a noite mais animada do mundo por sua vasta programação de lazer noturno que pulula o calendário, de segunda a segunda de cada semana, pode, em breve, se transformar em um cemitério após a 12ª badalada notúrnica. Seria, o que não realmente não creio, exterminado uma de nossos raros atrativos e certamente o tão desejado fluxo turístico irá minguar.

E que todos saibam que sou abstêmio há muitos anos, mas que conheci em bares nas madrugadas personalidades como Rogaciano Filho, Márcio Catunda, Sérginho Redes, Katia Freitas, Rosemberg Cariri, Mário Memede, Mona Gadelha, Joe Pimentel, Moura, Nilton Fiore, Silvio Gadelha, e tantas outras pessoas que são caras a nossa gente. Deixar de beber é uma questão de consciência e nunca uma questão de Estado.

domingo, dezembro 7

Give peace a chance (réquiem para um verdadeiro herói)



Em 8 de dezembro de 1980, há 28 anos, aconteceu uma atitude individual das mais estúpidas da história. O imbecil americano Mark David Chapman, em Nova York, quis entrar para a história da humanidade assassinando o último grande pacifista que este mundo já viu. Era morto John Ono wiston Lennon. O Ono herdou da esposa, Yoko, mostrando a sua profunda reverência a todas as mulheres. Morreu consciente, assistindo seu sangue se esvair dentro de uma viatura, no ombro de um policial. Que grande estrago as balas de um revólver calibre 38 fez aos amantes da paz, da boa música, da luta por um mundo mais justo.

Ironia do destino, Lennon tombou em frente ao prédio onde morava, em Nova Iorque, o Dakota. Internacionalista, se referências de patriotismos em toda a sua bibliografia, havia escolhido aquela cidade para viver por ser a única, entre as que conheceu, onde podia andar livremente, sem necessidade de segurança ou temendo ser engalfinhado pela multidão. Essa liberdade facilitou a ação do psicopata que após efetuar os disparos esperou calmamente ser preso, tendo em suas mãos o livro “O Apanhador no Campo de Centeio”.

São inúmeras as suas manifestações em defesa da paz. Certa vez passou um dia todo na cama com a sua esposa, e pediu a todos que em vez de lutarem da guerra fizessem amor. Também encabeçou o movimento pelo fim da guerra do Vietnam, levando o então presidente Richard Nixon a pedir a sua extradição, que infelizmente, para o restante da humanidade, não aconteceu.


A sua carreira solo iniciada em dezembro de 1970, logo após a separação dos Beatles, foi interrompida em 1975, por cinco anos. Foi cuidar do seu filho Sean, enquanto a sua amada esposa se ocupava com os negócios da família. Afinal, alguém naquela casa precisava trabalhar.
Suas palavras continuam tão vivas como nunca. Dêem uma chance a paz. O mundo continua em guerra.

Para ver e ouvir a música, clique aqui

quarta-feira, dezembro 3

De um só fôlego


Na Suécia, 46% das mulheres sofreram violência de homem; 13% das mulheres foram vítimas de violência sexual fora de uma relação; e 92% das mulheres não prestam queixa a polícia após sofrerem violência sexual.

Essas três frases pontuam as divisões do livro Os Homens que Não Amavam As mulheres, que faz parte da trilogia Millenium, do jornalista sueco Stieg Larsson, morto em 2004 de ataque cardíaco, logo após entregar os originais a sua editora. Mesmo com a caudalosa edição de 522 páginas, é livro para ler de um só fôlego. Os personagens protagonistas conduzem a história com uma dinâmica própria e chegam a um final nada previsível. Trata-se de um jornalista de uma revista econômica sueca, que é contratado para escrever a história de uma família rica e decadente de seu país, quando estava para cumprir uma pena de prisão por ter sido julgado culpado por um processo de calúnia movido por um outro milionário, rival de seu contratante.

No meio do percurso tem de desvendar um mistério e para tanto recorre aos dons investigativos e hackers de uma jovem de comportamento nada convencional. Ele precisa descobrir o que aconteceu com uma jovem de 16 anos, da época, desaparecida há mais de 30 anos. O trajeto o leva a encontrar alguns pares de esqueletos nos armários os mais diversos. Ninguém está acima das suspeitas.

O que mais ficou evidente para mim é que a violência de homens contra as mulheres extrapolam as barreiras étnicas e sociais. Um país como a Suécia, com um padrão de vida considerado dos mais faustosos do mundo, ainda não se viu livre dessa chaga. O autor, através do seu enredo, e dos personagens femininos, mostra toda a ojeriza que tem a essa tipo de crime. Não segue padrões morais tradicionais, mas aponta uma ética e uma honra que nos deixa o que pensar.

Não sei se este é um deslize da tradução, mas, se não for, demonstra a dificuldade com que a maioria dos jornalistas trata com os números. Na página 435, um texto sobre a Austrália diz que o país tem 120 milhões de ovelhas e exporta anualmente 700 milhões de toneladas de carne desse animal. Ou seja, se todo o rebanho do país for abatido a cada ano, o que seria impossível à manutenção do plantel, cada animal pesaria em torno de seis toneladas, o que, convenhamos, é um peso excessivo até para gado bovino. Esta falha, contudo, não tira o brilhantismo do autor, a beleza da história, mas põe sob suspeição possíveis falhas nos demais números assinalados pelo autor. De sorte, recomendo pela diversão garantida aos que se engalfinharem pelas páginas deste livro.

Outros comentários podem ser lido em:

http://blogdofavre.ig.com.br/2008/11/os-homens-que-nao-amavam-as-mulheres/

http://revistaspeculum.wordpress.com/2008/10/16/os-homens-que-no-amavam-as-mulheres/