O Zé Padilha arrochou o nó. Meteu goela abaixo de todos nós que fomos lá ver o Garapa a fome que grassa nossos rincões. A verdadeira face do Fome Zero é muita fome, e zero de melhoria de vida do povo. Agora ninguém mais vai sucumbir de uma hora para outra que nem judeu em campo de concentração. Todos têm direito a mitigar subnutrição dias a fio, com a saudável perspectiva de receber alguma ajuda bissexta.
Em preto e branco, o diretor de Tropa de Elite retratou o cotidiano de três famílias sobrevivendo, cheia de filhos, em condições sub-humanas. Não é só a falta de alimentação que ressalta aos olhos no filme Garapa (mistura de água e açúcar oferecida às crianças nos dias em que falta o leite). Tantas outras carências acompanham as cenas. Falta higiene, água potável, um lugar minimamente limpo para o convívio. Meninos e meninas na primeira idade dividem espaço com cachorros e porcos. Moscas infestam os pruridos na pele de um que recém deixou de engatinhar. E o médico diz que é só uma alergia. Basta livrá-lo das muriçocas que as chagas Irão desaparecer. Mas como é que isso poderia acontecer?
E tudo rodado em preto e branco em Fortaleza e mais duas localidades interioranas. A escolha das famílias, segundo o diretor, foi totalmente aleatória. Mas se ele quisesse escolher, acharia desgraças muito mais graves.
As pessoas retratadas também em tons de cinza pareceram-me extremamente apáticas. Notadamente os homens. Como se estivessem conformados com a morte-lenta. Se há alimentos para 15 dias, a cada mês, porque se assustar com a morte? Então a parada é se maldizer, condenar os infortúnios advindos da má sorte, e transferir a responsabilidade para o céu que não quer chover.
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2 comentários:
Lendo o seu post, senti a mesma angústia que senti vendo "Morte e vida severina", mas dessa vez em preto e branco e sem atuações. A fome é feia, tem cara de herege, já dizia minha vó e tem o paradoxo de não ser novidade e sempre ser. Lembrei de uma história vivida pela Elza Soares que ela foi se apresentar pela 1° vez com uma roupa frouxa, ela muito magra e feia. O apresentador riu e perguntou de qual planeta ela era. Ela respondeu:"Do planeta fome".
são questões complexas...não chove, não tem trabalho, não tem dignidade...e sobra as mazelas de quem jah se sente inutil no sertão por não poder fazer o que sabe, e a falsa impressão de que na cidade as coisas podem melhorar. eh sufocante saber que os problemas dependem da melhoria de uma série de coisas, mas principalmente da honestidade, e que as perspectivas de melhora são tão escassas. desanimador.
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